Sirius - Capítulo 8
Capítulo 8: O Chifre de Sleipnir
— O que foi isso? — O estrondoso rugido parecia fazer até as paredes da caverna vibrarem. Enquanto isso, o homem riu da ignorância de Li.
— “Isso” foi um troll. Acredito que também não saiba o que é. — Debochando, continuou. — Bem, a estupidez é uma benção, acredite. Eu não queria reconhecer um som desse. — Franzindo a testa, ele falou com a mulher na mesma língua estranha de antes.
— Solte ele.
— Pai, você tem certeza?
— Não podemos fazer isso com ele preso.
Depois de uma curta discussão, a jovem se levantou e caminhou até Jihan, apesar da falta de vontade estampada em seu rosto. Vendo mais de perto, ela era extremamente bela, provavelmente a mulher mais bonita que Li já viu em toda sua vida. A beldade sacou uma faca de sua cintura e cortou as cordas em suas mãos e pernas enquanto o homem se aproximou estendendo a mão.
— Ainda não nos apresentamos. Sou Itzal, um elfo negro. Essa aqui é minha filha Akemi. Ela é… bem… ela.
Vendo a diferença física clara dos dois, ele achou melhor deixar as perguntas de lado. “Um elfo… então é daí que vem as orelhas”.
— Prazer, sou Li Jihan, mas pode me chamar apenas de Li. — Cumprimentando-os, ele continuou. — Então, pode me explicar melhor o plano? Melhor, pode me explicar onde eu estou?
Itzal, estupefato pela falta de conhecimento do garoto, se sentiu compelido a ajudá-lo.
— Não temos muito tempo, então vou ser bem rápido. Estamos na ilha de Erítia. É aqui onde é conduzido o teste dos Deuses. Basicamente, tudo que você tem que fazer é sobreviver durante três dias para passar no teste. E honestamente… estou surpreso… que você chegou ao segundo dia vivo… mas isso não vem ao caso!
Seu rosto demostrava certa decepção, apesar de que parecia ser mais com ele mesmo do que com o jovem.
— De qualquer forma, não estamos aqui para apenas sobreviver. Queremos mérito e, para isso, precisamos de um feito.
— Um feito? — Li sentiu um calafrio subir pela sua espinha — E como isso tem ligação com o rugido que ouvimos agora há pouco? — Mesmo já sabendo da resposta, não parecia uma má ideia confirmar…
— Absolutamente tudo! Pois, ele é o nosso objetivo! — O homem gesticulou, como se sua frase fosse grandiosa; mas após ver a falta de reação de Jihan, ele corrigiu a postura um pouco envergonhado.
— Não é à toa que você não saiba. Esse troll tem algo de especial que outros não têm. O Chifre de Sleipnir! — Novamente, sem reação.
— O que tem de tão bom em um chifre? — Li coçou a cabeça.
— Não é “qualquer” chifre! É um item especial. Com ele, você pode forjar um artefato que te permite usar as habilidades de Sleipnir durante um curto período. Entende agora? Você pode correr mais rápido que o vento, sobre as ondas e até planar no ar!
“Incrível!” Jihan comemorou por dentro. Ele estava tentando extrair o máximo de informação possível. Honestamente, quando o viu pela primeira vez, pensou que Itzal fosse uma pessoa ruim; mas com um pouco mais de confiança, o velho tinha uma personalidade bem excêntrica.
— Entendi! Deve ser um item único! — Com um sorriso no rosto, ele demostrou mais emoção para não deixar o elfo desconfortável.
— Exatamente! E é por isso que nós vamos roubá-lo!
— Roubá-lo? E como você planeja fazer isso? — Li o questionou.
— Eu? Você quer dizer como “nós” pretendemos fazer isso. — Abrindo um sorriso de orelha a orelha, o elfo continuou. — Escuta, Li, pelo que me parece, você não fez nada nos últimos dias. Sobreviver é o suficiente para passar no teste, mas se quiser ser alguém, precisa se destacar. Caso contrário, você será só mais um no meio dos que se esconderam.
Li lembrou-se do que Michael disse na madrugada. “Ver o lado positivo.” Então é isso que aquele idiota estava se referindo. Não saltar a primeira fase pode me trazer problemas, mas também pode me trazer oportunidades. O cérebro de Jihan começou a trabalhar.
— Bem, se estiver com medo, não me importo de não o levar comigo.
— Não. Eu aceito. Você está certo, se eu me esconder, serei só um qualquer no meio de muitos outros. — Estendendo a mão na direção de Itzal, o jovem completou. — Espero que possa me ajudar então.
— Boa decisão, garoto. — O elfo apertou a mão estendida. — Então, é melhor irmos. Explicarei o plano ao longo do caminho.
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Em um canto da floresta, três pessoas caminhavam.
— Então ele se regenera? — Uma voz saiu de trás dos arbustos, seguido de uma mão tirando-os da frente e revelando o rosto de Jihan.
— Sim, Trolls tem uma vitalidade fora do normal, por isso são tão difíceis de matar. — Itzal logo ao lado respondeu.
— Entendo. Não me admira que ninguém tenha conseguido pegar esse chifre mesmo após tantos anos. Digo, se é tão poderoso, aposto que muitos antes de nos tentaram roubá-lo.
— Bem… sim e não. — O elfo colocou a mão no queixo tentando pensar em uma maneira simples de explicar. — De maneira grosseira, então. O teste dos deuses sempre possui um desafio desse tipo. O que alimenta o potencial do próximo item, na realidade, é quantas pessoas morreram para adquirir o último. Claro, não é só isso, mas é bem perto.
— Entendi…
— Mas não precisa temer, garoto! — Vendo a expressão preocupada de Li, o velho o assegurou. — Não vamos lutar contra ele, além disso, estou aqui para te proteger! — Apontando para si mesmo, ele sorriu.
Apesar de parecer estúpido, Li se sentiu um pouco melhor. O tom que o elfo usava passava bastante tranquilidade. Ele era uma boa pessoa. Só isso já era o suficiente.
Um passo atrás deles, Akemi os acompanhava, ainda um pouco insatisfeita. “Por que ele teve que vir junto? Só nós dois já daríamos conta tranquilamente.”
— Bem, agora que você sabe o contexto, vou te explicar o que faremos. Você já deve ter percebido o trovão que cai de noite, não percebeu? Ilumina a floresta inteira. — Vendo Li acenar com a cabeça, ele continuou. — Muito bem, mas tem um detalhe que pouquíssima gente percebe. Digo, quem pararia para olhar isso? O trovão cai sempre no mesmo lugar. No centro da ilha.
Li pensou por um segundo e facilmente conseguiu se lembrar. De fato, todas às vezes que ele viu o raio cair, foi na mesma direção.
— E por que isso? — Perguntou curioso.
— A princípio ninguém sabia, mas existe uma regra de ouro entre os desafios que permeiam a ilha de Erítia. Todos podem conquistá-lo. O que é a melhor e, também, a pior das notícias.
— Por que isso seria ruim? — Confuso, Jihan não pôde deixar de perguntar.
— Vou te dizer uma coisa, Li. E você Akemi, escute também. — A mulher se aproximou para escutar, o que fez Jihan ficar mais curioso. — O mundo é para aqueles que nascem para o conquistar, não para aqueles que sonham que podem, mesmo que tenham razão.
Li não entendeu direito e fez uma expressão de estranhamento; mas a filha concordou com a cabeça, como se seu pai tivesse dito a frase mais sábia que ela já ouviu.
— Essa é minha filhota, diferente desse idiota aqui, você sabe apreciar bons conselhos. — Itzal adulou a cabeça dela e, como compensação, recebeu o primeiro sorriso desde que Li apareceu.
“Linda!” foi a única frase que seu cérebro potencializado pensou. Com certeza, era o sorriso mais belo que ele já viu.
— Agora, idiota. — O elfo brincou. — O que quero dizer é: mesmo que exista uma possibilidade de qualquer um conseguir, você precisa ter sorte para descobrir o “como”; mas, novamente, quem em sã consciência arriscaria vigiar um monstro daqueles para descobrir isso? — Apontando para si mesmo, continuou. — Eu arriscaria!
— O que você descobriu? — Ansioso, o apressou.
— O motivo do raio cair no mesmo lugar é o próprio chifre! Então, quando escurece, o Troll o coloca à distância para evitar ser atingido. Mesmo com sua regeneração, esse monstro não é resistente a queimaduras. Se ele sofresse dano toda noite, de algo tão forte, não conseguiria resistir!
— É aí que eu entro? Você quer que eu o distraia? — Li perguntou, já temendo por sua vida.
O homem deu risada.
— Você está se superestimando. Se eu fosse deixar alguém tão imaturo cuidar disso, todos nós morreríamos!
— Bom saber que o senhor confia em mim.
— Não leve para o coração, Li. Cuidarei dessa parte. Você e a Akemi só precisam pegar o chifre e sair o mais rápido possível.
— E como você vai saber se conseguirmos?
— Ah, ele vai saber, então eu também vou. — A frase tenebrosa junta do sorriso a fez parecer bem menos assustadora. — Como eu disse, saia de lá e corra para longe, o mais rápido possível.
Após andarem por várias horas, a lua já alcançava o topo do céu.
— Vamos parar e descansar. Lembro de ter visto uma caverna, ontem, quando passei por aqui. Amanhã devemos chegar ao ninho do Troll. Esperaremos lá até o anoitecer e prosseguimos. Será o último dia, então teremos pouco tempo após escurecer.