Spes Homini - Capítulo 25
O sangue finalmente havia parado, contudo a cara de dor que Ryan expressada teimava em persistir.
— Eu acho que não vou conseguir acompanhar-te — dizia o homem enquanto colocava a sua mão sobre a roupa do assassino — Eu fico bem, a prioridade é o presidente. Se eles chegarem lá primeiro… — uma aflição repentina subiu-lhe à boca fazendo-o soltar uma tosse que ele tentava esconder — Caralho, a pior parte é sempre quando a adrenalina passa.
— Não te preocupes. Eu não vou demorar.
Michael agarrou aquilo que achava necessário e passou pela porta sem nem hesitar deixando o seu companheiro para trás. O corredor parecia tão calmo quanto antes, talvez até mais, já que a tensão que os rodeava tinha desaparecido.
Olhou para um lado e em seguida para o outro, não havia luz. Dentro do quarto a luz da lua era suficiente e nem os fez questionar da falta dela que se fazia sentir lá mesmo com a porta aberta para o corredor, mas agora de frente para o problema apercebera-se que a eletricidade havia sido cortada. O sentido da visão era agora meramente decorativo.
Com a mão esticada tentou tapear algo, uma tentativa inútil que o fez desistir de imediato da ideia de tentar ir até às escadas sem luz. Em seguida retirou uma pequena lanterna do bolso, utilizá-la não era a melhor alternativa, tornava-o um alvo fácil na escuridão caso os inimigos tivessem óculos de visão noturna, ele sabia que eles tinham.
Os raios artificiais do objeto travavam uma constante luta contra o denso desconhecido que o rodeava. Porém era inútil, poucos metros à frente a sua influência era pouca e a visão tornava-se inútil de novo.
Por outro lado, tudo estava calmo demais, era uma tranquilidade sinistra, envolvida na ternura do desespero e ansiedade do desconhecido. Contudo os passos do assassino tomavam aos poucos o centro dessa perturbação, constantes, começavam a sincronizar-se com os batimentos frios do coração.
“Já devo ter andado mais de cem metros e ainda não encontrei as escadas, eu jurava que era por aqui…” — pensou ele em simultâneo com o movimento que fazia com a lanterna, apontando a luz para todas as direções.
Esticou o braço que carregava o objeto para conseguir ver um pouco mais adiante, algo que parecia uma porta surgiu. Talvez fosse o que ele procurava. Acelerou o passo para junto dela e tapeou a superfície de madeira até sentir a maçaneta, estava um pouco dura, com a velocidade dos elevadores o mais provável era não ser aberta há anos. Girou um pouco com mais força em seguida e sentiu a porta abrir aos poucos.
Foi recebido com uma intensa luz lunar. A parede que dava para a rua era repleta de vidros, de uma ponta à outra. O assassino olhou aquilo maravilhado, sempre tinha escutado palavras sobre a beleza estrondosa da famosa escadaria de cristal, mas ela estava ali, vidros e mais vidros, e no fundo de todos eles a cara de um homem perturbado que subia aos poucos cada degrau era refletida, como se fosse uma prisão para se perder no infinito espelho da mente.
— Acho que a lanterna não faz falta agora — colocou o dedo sobre o botão de desligar e cessou os raios artificiais — O problema agora é tentar encontrar o lugar onde está o presidente — deu um longo suspiro e continuou a sua subida. Depois, umedeceu os lábios desidratados, começando a pensar em todos os lugares onde o homem podia estar.
— Será que é desta que eu consigo arranjar o comunicador — dizia Nicolai em monólogo antes de cruzar os dedos — Por favor, já estou cansado de ver tantos fios.
Ele ligou em seguida o aparelho. Recebeu um som de estática nos ouvidos acompanhado por algo que parecia ser uma voz, no entanto ele não conseguiu identificar o que dizia.
— Ah… Vai se foder, cansei de tentar arranjar esta porra — segundos depois arremessou o comunicador contra a paredes, caiu de imediato no chão desfeito em dezenas de pedaços — Ainda bem que estás todo partido, achas que eu tenho cara de otário para tentares brincar comigo arrombado.
O monólogo ameaçador que se dirigia ao objeto sem vida despedaçado no chão seguiu por mais uns minutos. Assim que se cansou de tentar ganhar a discussão caiu sobre a cama do quarto cansado.
— Talvez seja melhor eu tentar fazer alguma coisa do que morrer de tédio no quarto… Queria mesmo era a Evelyn aqui…
De olhar focado na negridão calmante do teto ouviu algo vindo da porta que dava acesso ao corredor. A maçaneta estava a girar aos poucos, de uma forma que meia dúzia seriam as pessoas que ouviriam dentre milhares, e a verdade é que se o monólogo ainda aquecesse as palavras dele o som não teria perturbado o seu pensamento.
Erguendo o corpo agarrou na pistola que tinha no canto da cama, apontando-a para a porta. Aos poucos ela foi-se abrindo, do outro lado estava um homem alto de vestes negras que caminhou a passos curtos para dentro. Parecia olhar para baixo o que fez não reparar nas aconchegantes boas-vindas.
Três tiros foram disparados no exato momento em que o homem notou que alguém o olhava do quarto. Caiu morto no chão com os mesmos olhos que tinham visto a morte. Nicolai por entre o som abafado dos disparos notou o ruídos de pegadas suaves pelo corredor. Talvez ele estivesse em grupo? Pensou.
— Caralho, eu não pensei que eles viessem atrás de mim, — falava ele sozinho em voz baixa — eu não sei bem quantos eu ouvi… talvez fossem mais uns quatro lá fora? — arremessou sem pressa uma granada de fumo na direção da porta — Eu preciso de ver que arma eu uso. E se for uma sniper? — suspirou fundo — Não, inútil nesta situação, a melhor é aquela metreladora que eu trouxe… Onde eu pôs essa porra?
O atirador rebulando para o lado da cama mais perto da parede começou a revirar todo o arnesal que mantinha dentro do quarto de hotel. A cada segundo a mais se que passava a nuvem fumaça começava a dissipar-se e a tempo escorria pelos dedos dele. Foi então que no meio das munições e caixas de pizza que ele a encontrou, uma arma de última geração das indústrias Italianas. Retirou-a da caixa com cuidado, confirmando logo depois se estava tudo em ordem antes de a carregar.
Desligou a trava de segurança e olhou para a porta com um sorriso no rosto, uma frase veio de imediato no seu pensamento, era digna dos filmes antigos que ele via de ação: — Seus filhos da puta está na hora de comerem chumbo — com o dedo no gatilho abriu fogo sobre eles, destruçando a porta de madeira, era apenas um pequeno dano colateral.
Com as veias a bombear adrenalina levantou-se de cima da carpete de veludo, prendendo antes a sua pistola pequena ao pulso por um fio de segurança, e correu para dentro da nuvem de fumo ainda a disparar rajadas de tiros sem parar. Exercitou tantos as pernas que já nem sabia onde estava no meio da neblina cinzenta, continua a ouvir passos, mas agora eram de todas as direções.
“O melhor é parar um pouco, não me restam muitas balas já, eu tenho de os ver para começar a tirá-los do jogo.” — pensou ele sem se dar conta que agora só restavam alguns focos de fumo que não eram suficientes para o mascaram dos inimigos.
Voltando dos seus pensamentos deparou-se com vários adversários a correrem ao seu encontro. Disparou uma primeira rajada para os que estavam há sua frente, apenas os primeiros caíram, outros cindo que vinham atrás continuaram sem parar. Os que corriam nas suas costas, viram a arma ser apontado naquilo que se pode descrever como uma pose de metaleiro, foram velozmente acarinhados com sete disparos.
Assim que rodou a arma os da frente estavam a alguns passos do atirador, o mais próximo dele vinha com uma adaga, suava por todos os lados e abrandou assim que chegou perto do alvo. O agente da Spes Homini aproveitando a hesitação acertou-lhe com a arma na cabeça, o corpo caiu aos seus pés jorrando sangue pela cara.
— Vamos quem é o próximo? — soltou uma gargalhada muito alta — Acho que não foi este tipo de atividades que o médico me recomendou quando saí dos hospital, mas é sempre divertido — falava Nicolai ao mesmo tempo que explodia a cabeça de um que saltava na sua direção com um tiro.
— Homens recuar, não podemos ter mais baixas. O alvo continua a ser o presidente e não um sniper qualquer.
O atirador reconheceu de onde vinha a voz, era um dos que estava atrás que agora corria com medo. Voltou às costas para os que estavam mesmo à sua frente e gritou para ele: — A quem pensas que estás a chamar de sniper qualquer? — Ele tentou voltar-se para responder à pergunta. Porém as balas do Nicolai eram mais rápidas, com um simples tiro, pedaços de sangue e cérebro voaram por todos os lados. Uns que corriam ao lado dele tentavam limpar aquele nojo das roupas, outros abrandavam para ver a situação — É isso mesmo seus filhos da puta, o hotel mudou de gerência e o novo dono não está aberto a críticas.
Distraído a soltar palavras aos inimigos, esqueceu-se dos dois que estavam atrás de si. O primeiro avançava com uma katana erguida pronta para espetar. Nicolai antecipou-se e colocando a sua arma na frente para impedir o golpe só teve tempo de chutar o homem.
O assassino recuperou o controle rapidamente, mas era tarde demais para impedir a bala da pistola do agente. Com sangue nos olhos ele procurou o último. Porém a faca que ele carregava na mão já manchava a sua barriga de sangue quando ele se apercebeu.
Com a adaga adversário presa no seu peito, o atirador, aproveitou para colocar a ponta da arma sobre a pele que protegia o coração e explodi-lo num ato de misericórdia.
Os poucos invasores que ainda restavam no meio da confusão tomaram o labirinto infinito de corredores como esconderijo, deixando os corpos e o atirador à mercê da sorte. Ele viu-os fugir, contudo não tinha forças nem para levantar o braço.
Tentou caminhar para dentro do quarto, mas ficou pelo caminho, sentado no chão junto à parede do corredor. Sem adrenalina a dor começava a remoer a sua cabeça, os grunhidos ecoavam por todo o lado e o sangue manchava o tapete preto requintado que decorava todo o chão…