Uma Nova Lenda Surge - Capítulo 19
As seis sentenças do cubo traduzidas por Guesme, contavam suas histórias de forma separada, falando sobre mitos antigos de nosso mundo.
O conto “A Ordem do Esquecido”, retrata sobre nossas vidas passadas, das quais já nos esquecemos, o que explica as histórias das tribos que guardavam o cubo.
O conto “O Fogo de Reus”, conta sobre as brasas remanescentes de um vulcão de mesmo nome que sempre está em chamas.
O conto “O Retorno da Água”, fala de uma antiga civilização que se perdeu em meio aos oceanos de uma terra distante.
O conto “O Inicio de Uma Ordem”, se trata mais sobre uma nova ordem que será criada para corrigir os erros remanescentes dessa guerra.
O conto “Saturn e Merch, as Deusas”, fala sobre as duas irmãs filhas da Morte e da Justiça, que brigaram por um trono nas terras altas.
O conto “O Badalar do Fim”, traz o fim do tempo como premissa, também conhecido como o embate pela verdade, onde dois deuses se enfrentaram por uma só paz, antes do portão do horizonte ser aberto.
Cada história com a sua premissa e fim, onde no fim apenas a verdade prevalecerá.
— Me pergunto em qual capitulo estou… — Leio em voz alta a ultima sentença da página.
— Roro que livro é esse? — A Lili se aproxima do cantinho onde me aconcheguei.
— O nome dele é “Caminhos Para o Inferno”, é um de três diários de um pesquisador, acho que o Mestre os colocou ontem aqui, estavam escondidos dentro de uma pequena caixa.
— Hum… Você estava tão concentrado nele que eu me perguntei qual era o assunto?
— Seu autor estava estudando sobre o cubo e demais artefatos e acontecimentos que ocorreram no nosso mundo e entre eles o cubo se destacou na pesquisa.
— Por isso que você não tira os olhos dele.
— Roro, poderia vir aqui um momento? — O Mestre desce as escadas que dividem a biblioteca dos pisos superiores, parando no segundo degrau da escadaria em espiral.
Eu tinha ido para o piso superior apenas duas vezes, em todos esses anos, para poder trabalhar com os equipamentos químicos que o Mestre mantem lá.
No entanto agora eu estava sendo chamado por outro motivo, talvez por causa do fim dos meus três dias. Subindo devagar os degraus, passamos pelo primeiro piso, onde as ampulhetas, bico de Bunsen e fracos que se amontoavam nas prateleiras com os demais químicos.
Seguindo para o segundo piso, uma pequena mesa redonda no centro com quatro cadeiras em seu redor, com vários papiros e pergaminhos esparramados sobre ela. Ao redor da sala vários livros empilhados pelo chão, com poucos estando organizados sobre uma prateleira em uma das quatro estantes do cômodo.
Sentada em uma das quatro cadeiras Sinabern permanecia lendo alguns dos papiros que se amontoavam em sua mão esquerda.
— Sente-se um pouco Roro, teremos uma pequena conversa sobre você…
Caminho até a cadeira ao lado de Sinabern e me sento observando os papiros que estavam a minha frente. Em sua maior parte eu não conseguia entender o que estava escrito, mas sabia por instinto que se tratava da guerra dos seres de asas.
— Roro… — O Mestre começa a falar após sentar ao meu lado. — Você não sabe muito sobre o próprio passado e nem sobre o futuro, mas como você já está envolvido nisso, acredito que tenha o direito de saber mais.
— A marca que está em suas costas liga a sua alma e mente com as outras quatro chaves e com o Milorde, no entanto você provavelmente não conseguirá acessar as lembranças dos de mais facilmente.
— Para ser mais exato Roro, nós somos e não somos a mesma pessoa, o que quer dizer que caso eu queira eu posso dividir as minhas memórias com você.
— Acho que entendi…
— Roro, você deve saber que em breve uma grande batalha atingirá essa região, e eu preciso que você lute conosco, acredito que tudo o que eu ensinei para você ao longo dos últimos anos seja o suficiente.
— Mestre eu lutarei sim, defenderei a Lili e o povo da vila!
— Você me lembra a sua mãe, ela sempre estava disposta a lutar pelo seu povo.
— Mestre você disse que eu não sei sobre o meu passado, e as minhas memórias ainda continuam turvas.
— Irei compartilhar as minhas memórias sobre aquela época com você Roro, eu só peço que me perdoe.
O Mestre levanta e vem em minha direção encostando a sua mão sobre a minha cabeça, aos poucos o mundo foi se distorcendo e fragmentando até que se escureceu por completo.
Aos poucos o mundo foi se reconstruindo novamente, eu encarava uma grande caneca contendo um liquido amarelado que tinha um forte cheiro de álcool, a minha vista estava debilitada aquilo por um grande capuz que cobria minha cabeça.
— Senhor o seu ensopado de porco!
Uma jovem mulher se aproxima de mim me entregando uma tigela cheia de sopa, o vapor que saia dela chegava até as minhas narinas e me intoxicava com o seu agridoce sabor.
— Agradeço. — Eu falo sem perceber, minha voz não era mais a mesma, tinha um tom mais grave que o normal, lembrando a voz do Mestre.
Começo a comer deixando o sabor me mergulhar em um rio de sabores magníficos, mas algo me dizia que não estava lá apenas para isso, já que olhava de um lado para o outro repetidas vezes.
— Está procurando alguém? — Alguém fala em minhas costas.
— Acredito que apenas quando sol nascer ele chegará. — Falo em um tom mais baixo.
— O pacote já está pronto, está escondido no local de sempre.
— Certo.
Coloco a mão em um de meus bolsos e tiro um pacote que continha uma espécie de pó roxo e entrego para a figura.
— Espero que a qualidade seja a que cominamos.
— Não se preocupe não furo contratos.
O homem se levanta e sai da taverna sem deixar suspeitas. O pó em si que eu tinha entregado se chama pó de anjo, uma forte droga alucinógena que é extraída de um cristal de coloração roxa.
Após terminar a refeição e pagar por ela, saio cambaleando entre as vielas da cidade até chegar ao cemitério da colina ao sul do vilarejo.
Ajoelho-me diante de uma das lapides em forma de cruz para pegar uma pequena caixa que se mantinha enterrada no local. Dentro da pequena caixa tinha alguns papeis com a localização e descrição de uma jovem mulher.
— Me perdoe…
Acendo chamas escuras na mão que segurava os papeis e fico observando eles queimando com amargura em meio à noite de lua cheia.
Quando sobraram apenas cinzas, retorno a cidade onde os bêbados retornavam para as suas casas embriagados após uma noite de festejo nas tavernas do vilarejo. As velas da cidade já apagadas deixando que a luz das estrelas sejam a única luz local.
— Qual é o próximo alvo Kardurins.
Um homem acima de um dos telhados das casas fala diretamente com a minha mente. Ele se escondia por uma capa que cobria seu corpo inteiro, deixando apenas a cabeça de fora, enquanto a brisa da noite a balançava cuidadosamente.
— Eu cuidarei dela fique fora disso.
— Você deveria parar de tentar proteger os humanos e aproveitar do curto período de suas vidas enquanto pode.
— Não sou como vocês seres da noite. Deixe-me fora disso.
— Você deveria para de mentir para si mesmo, de qualquer forma, boa sorte, estarei atrás do outro enquanto você brinca de casinha com os mortais.
O vento fica mais forte na região, balançando o manto que o cobria com mais força enquanto o seu dono se distanciava com um salto.
Após o desaparecimento da figura sigo o meu caminho até a casa do senhor feudal, caminho lentamente me escondendo das sombras da noite, sem deixar que os cavaleiros em patrulha me notassem.
Após chegar a grande porta de madeira bato com força três vezes, o som ecoa pelo saguão do outro lado, passa-se cerca de cinco minutos até que eu ouço o barulho de uma fechadura sendo aberta.
— Sim… — Uma voz sonolenta feminina vem de uma pequena fresta que foi aberta.
Sem falar nada forço a abertura da porta, e prendo a jovem mulher que vestia uma camisola com meu braço direito a impedindo de gritar, enquanto pego um pano húmido com a outra e coloco em sua face a fazendo desmaiar em sequencia.
Coloco o corpo da jovem empregada estendido no chão e fecho a porta da mansão, pego o castiçal que a mesma carregava e sigo caminho para os andares superiores onde encontraria a mulher dos documentos.
Deixo o castiçal do lado de fora e entro calmamente no quarto, a cama envolta por cortinas de seda avermelhadas, escondida em meio às volumosas colchas uma jovem e bela mulher.
— Me desculpe… — Falo antes de me aproximar segurando uma adaga.
Subo em seu pequeno corpo e minha respiração começa a pesar como se o ar ao redor estivesse sumindo aos poucos, aproximo a adaga de seu peito aos poucos para ajustar a mira.
Após ter certeza do local onde deveria ataca-la, ergo as mãos para cima de minha cabeça e tremendo de nervosismo, sinto uma gota de suor escorrendo pelo meu rosto e indo de encontro com o peito da jovem.
Mas no fim, acabo por falhar e arremesso a adaga para um dos cantos do quarto e saio de cima do meu alvo, desviando o rosto e me aproximando da janela que permitia poucos raios lunares banharem o quarto.
— Talvez eu deve-se ter deixado ele ter vindo no meu lugar…
— Por que você não consegue me matar?
— Pensei que estivesse dormindo Stephanie.
— Desculpe-me, mas acho que nunca te vi nesse vilarejo antes, você poderia me dizer ao menos o seu nome?
— Me chamo Kardurins.
— Kardu… O seu nome é bem incomum. — Ela vem do meu lado e observa o vilarejo já escurecido pela penumbra.
— Você não está com medo?
— Não, mas sim curiosa. Por que você tem que me matar?
— Como você deve saber em seu corpo existe uma marca, ela te dará muito poder caso aprenda a usa-la, mas esse poder não lhe pertence e para devolver ao seu dono verdadeiro eu preciso te matar.
— Por qual motivo esse dono precisa desse poder?
— Estamos em meio a uma guerra e para encerra-la eu precisarei de todo o meu poder.
— Nesse caso, eu não me importo de ser morta, então vai em frente.
A jovem me entrega a adaga que eu havia jogado para o outro lado do cômodo e sorri com lagrimas em seus olhos esperando pela minha ação.
— Eu não posso… Se fizer isso serei igual a ele e isso eu não posso aceitar…
— E se eu me matar para que o ciclo se complete?
— Eu não posso permitir isso!
— Nesse caso, que tal fazermos uma promessa, retorne daqui dez anos e tente novamente, nesse tempo irei lutar junto de meu povo, me colocando no perigo para ajudar os outros e caso eu morra nesse tempo você provavelmente saberá.
— Acho que essa é a melhor opção… Partirei hoje e retornarei como prometido.
Saio da estrutura e continuo a minha viajem em busca de informações sobre o paradeiro das chaves, enquanto me alio a outros santos no caminho, até que chega a data limite.
Em uma taverna local descobri que ela havia se casado e tinha um filho pequeno que hoje tinha atingido os seu cinco anos, caminho até a velha mansão onde prometemos uma vez.
Chegando ao local escuto berros de uma mulher, sem pensar muito pulo quebrando uma das janelas do primeiro andar, os cacos esparramando pelo chão do local junto de farpas que se soltaram da estrutura de madeira.
A minha frente um homem segurava uma faca ensanguentada encarando uma mulher que agonizava no chão do saguão.
— Você cumpriu a sua promessa, mas o selo não foi quebrado.
— Quem é você?! — O homem fala nervoso ao escutar o estrondo que eu causei.
— Um velho amigo dela, e você?
— Theodor, o atual senhor dessas terras!
— Uma pena ver uma pessoa tão bondosa sendo morta por seu marido, mas não precisa enterrarei os dois nas mesmas chamas.
Avanço na direção do homem que aparentava estar paralisado pelo susto e nervosismo, o socando na boca do estomago, forte o bastante para ouvir o quebrar de alguns de seus ossos e arremessa-lo para a parede ao outro lado.
Caminho na direção do homem que não conseguia mais mover o corpo enquanto cuspia sangue e retiro a adaga de sua mão, indo em seguida até Stephanie que manchava o tapete com seu sangue.
— Pode descansar em paz, cuidarei de seu filho e acharei outra maneira para poder salvar ele dessa maldição que segue o seu sangue.
Com a minha força total, finco a lamina ensanguentada na cabeça da jovem finalizando assim a sua vida. Com o estalar de dedos crio uma pequena chama e a arremesso sobre as tapeçarias do cômodo e sigo para o andar superior enquanto as chamas devoram a casa.
Procuro pelo quarto do jovem senhor do feudo, antes que as chamas me alcancem. Ao chegar ao quarto pego a pequena criança e coloco-a, envolta de um manto negro, sobre os meus ombros.
Parto para longe da mansão já envolta de chamas, que atraia os olhares curiosos dos que não tinham pegado no sono ainda.
Sigo para o vilarejo vizinho onde deixo o garoto em um dos bancos da igreja local que regia um orfanato.
— Um dia retornarei para te buscar, até lá sobreviva sem as dores de seus antepassados.
Coloco a mão esquerda sobre seu rosto e pronuncio algumas palavras que não compreendia, ao retirar coloco um pequeno pingente de cobre em seu pescoço, antes de tudo retornar a ficar preto.
— Roro? — Eu escuto a voz do Mestre que tinha acabado de retirar a mão de meu rosto.
— Mestre… — Falo em tom falho. — Isso que eu acabei de ver… De viver, foi como você conheceu a minha mãe e me acolheu?
— Sim… Eu preferia manter isso escondido de você, mas tenho certeza de que não adiantaria muito…
— Eu preciso tomar um ar…
— Fique a vontade, se precisar de qualquer coisa é só pedir.
— Certo…
Eu sigo a passos lentos, como se tivesse reaprendido a andar, para o os pisos inferiores da torre até a sua saída, onde me coloco em pose fetal sentindo as lagrimas escorrerem por meu rosto tremulo.