Uma Rotina Escolar Comum Depois do Apocalipse - Capítulo 1
Capítulo 1 – A prisão
Numa noite fria, monstros gigantes caminhavam por uma grande planície. Eram campos férteis usados para o plantio… eram, pois os demi-humanos que lá viviam perderam suas terras.
Uns tentavam se esconder em cavernas, uns em suas cabanas malfeitas que chamavam de casas e outros, mais desesperados, fugiam em direção ao norte apenas para se encontrar com uma enorme muralha de concreto e soldados preparados para atirar naqueles refugiados.
Sem piedade, o sangue foi derramado, os fugitivos sabiam que seria assim, mas o medo pode entorpecer o julgamento. Pouco tempo depois, o sangue dos monstros também foi derramado, aqueles que esperaram pacientemente e não morreram, foram recompensados com a sobrevivência.
Era uma horda pequena, os guerreiros, usando de algumas magias poderosas, conseguiram matar 3 ou 4 bestas, as outras preferiram procurar comida em outro canto.
Por fim, iluminada pela lua, uma pomba saiu em meio aos escombros carregando uma carta escrita com o carmesim da morte. A ave voou escapando de toda a desgraça, seu rumo era ao norte, rumo às casas mais bonitas.
Passou pelos bairros dos humanos, pelo bairro dos militares e chegou, por fim, à área nobre, onde a maioria dos habitantes eram super-humanos, no caso, as raças: Vampiros, Elfos e Seriens.
Em uma das maiores casas do lugar, uma garota deixou a janela aberta e pronta para receber as provas da barbárie.
Uma singela lágrima rolou pelo delicado rosto da Hina e caiu na carta que ela estava lendo com dificuldade num grande quarto escuro. Seus olhos vermelhos como o fogo, em meio àquele breu, brilhavam refletindo a pouca luz que vinha por uma fresta.
Hina se levantou e andou até a janela, pensou em fechá-la de uma vez e só dormir… A luz invadiu o quarto, no fim mudou de ideia; a garota preferiu abrir a janela e permitir que seu amplo quarto fosse tomado pelo luar. Era visível uma cama king size, uma mesa de estudo, um grande armário, uma estante com tv e outras coisas, sem dúvidas um lugar de luxo.
Ela encarou o papel em mãos, pensou em queimá-lo, mas desistiu. Frustrada e insegura, a vampira deu um olhar triste para a lua, sabia que aquela seria uma longa noite. Por mais que tentasse, não conseguiria pegar no sono, os pensamentos e preocupações não a permitiam relaxar nem por um segundo. O peito apertava e sua mente vagava em inseguranças.
Junto com o medo, também havia um ódio que fervia seu sangue, aquilo era desumano, estupido. Quanto mais tempo passava, mais ela odiava aquele país, as pessoas ao seu redor e o exército ao qual jurou lealdade.
Eram quase 4 da manhã, mais uma vez a noite passaria sem ela conseguir descansar. Hina sabia, isso prejudicaria seus treinos, se pelo menos pudesse faltar tudo ficaria bem, mas descansar não era uma opção que tivesse à disposição. Para que pudesse mudar aquele país, precisava ser incansável.
Antes de voltar para a cama, a garota não pode deixar de ver uma faca no canto da sua visão, uma adaga que tinha ganhado de presente e esquecido em cima da sua mesa com os papéis e coisas que estava estudando.
“E se eu estiver machucada, será que ele me deixaria faltar ao treino? Posso alegar não ter condição de treinar.”
Naquele momento em que a mente dela estava cansando e o desespero se tornava ainda mais forte, Hina cogitou, por alguns segundos, esfaquear a própria mão; desistiu ao lembrar da responsabilidade que tem com todos. Hesitantemente, se deitou de novo, deixando a faca no mesmo lugar onde poderia pegar facilmente.
Mal conseguiu pregar o olho, pensamentos e problemas não saiam da sua cabeça, ela deveria decidir como agir diante de tudo que aconteceu, era sua responsabilidade.
Assim que acordou, por mais cansada que estivesse, escondeu a falta de sono com maquiagem e saiu de manhã com um sorriso no rosto e se encontrou com uma limusine esperando por ela.
Dentro do veículo, estava Lola, amiga muito próxima da Hina, quem ela mandava seu motorista buscar todas as manhãs. Gilbert Huns, que dirigia o carro, não gostava de ter uma demi-humana nele, mas não ousaria nem sequer dar um olhar feio com a vampira lá.
— Amiga, tenho que contar, tive um sonho… — Mal Hina entrou no carro e a garota começou a falar animadamente; porém, ao vislumbrar aqueles olhos vermelhos enfraquecidos, se calou por um tempo. — Aconteceu alguma coisa?
Hesitou um pouco, respirou fundo e decidiu assumir, da melhor forma que podia, uma máscara de força. — Tive uma dor de cabeça, não dormi direito; mas, relaxa, estou de boa… me conta aí, como foi o sonho?
Uma luz falsa surgiu naquela garota, seu sorriso era brilhante e forte. Até o fim, não conseguia se livrar da responsabilidade de carregar a esperança de todos.
Hina, enquanto conversava com sua amiga, decidiu o que faria, pegou seu celular e marcou uma reunião, no mínimo, ela precisava deixar claro seu descontentamento. Mas também escolheu, naquele momento, não contar para ninguém sobre o massacre, não queria causar comoção tão cedo, não era hora ainda.
ooo
Trimmm! Mais ou menos na mesma hora que Hina cogitava se mutilar, Taka estava acordando, ele precisava sair muito cedo para pegar o trem.
Apesar das olheiras e do cambalear de sono, o garoto andava rápido e mantinha um brilho forte no olhar, era seu grande momento de sair do campo. Só de entrar no veículo, ele já olhava os arredores empolgado e procurando novidades.
Como era de se esperar, um trem é sempre um trem. Depois de entender esse fato e receber alguns olhares intimidadores dos clientes incomodados, resolveu apenas cair no sono, não tinha nada de novo para ver.
O interior não era em nada luxuoso, estreito, com bancos nas laterais, restando um pequeno corredor onde duas pessoas mal poderiam andar lado a lado. Para a sorte de Taka, ele foi um dos primeiros a entrar e encontrou um lugar no canto onde podia dormir.
Foi assim que, completamente indefeso, o garoto tirou um cochilo durante toda a viagem. Vestia roupas comuns, não tinha nada fácil de roubar e chamava pouca atenção, por isso teve um sono tranquilo.
Assim os quilômetros passaram rapidamente. — Ai! Ai! — E, com dificuldade, Taka se levantou sentindo as consequências de dormir balançando num assento ruim por horas. Era nítido em seu olhar morto, a soneca mais o cansará do que descansará.
Apesar do cansaço, não esqueceu, nem por um segundo, de sacar o celular e… notar que a bateria tinha acabado. Logo um velhinho esperto notou o novato por ali, mesmo no meio de todas as pessoas andando pela estação.
— Olá, rapaz, — sorriu simpaticamente — é novo por aqui? Se precisar de alguma coisa, posso te ajudar. Vendo ticket de ônibus e tudo mais.
Pego de surpresa e sem pensar muito, comentou que precisava de um carregador portátil e, surpreendentemente, o velhinho tinha; depois, concordou em comprar o ticket.
— Foi um prazer te ajudar. — De repente, Taka notou algo, ele conhecia aquele sorriso alegre: tinha sido enganado. Na hora, voltou a pensar melhor e concluiu que nem fazia sentido comprar o ticket de uma pessoa aleatória.
Sim, ele tinha sido um pouco burro, deveria ter prestado mais atenção; mas, no minimo, poderia se vingar.
Trombou no primeiro cara que parecia nobre e roubou seu relógio, então chamou o velhinho de novo. — Desculpa, tem uma última coisa que queria perguntar, esse seu relógio, comprou onde? — Apontou para um relógio preto, claramente falso, que ele tinha na mão.
O velho, achando que tinha uma oportunidade, na hora mostrou os relógios falsos que carregava em uma pequena maleta.
— Nossa, esse aqui é lindo. — Se fingindo de idiota, apontou para um, cujo modelo era o mesmo do relógio roubado, mas de outra cor. — Devia ter comprado dessa cor, tenho um igual, só que é meio feio. — Por fim, ele jogou a isca.
— Bem… se quiser, não me importo em trocar um pelo outro, você foi tão simpático comigo, considere essa uma gentileza da minha parte. — Era impressionante a cara de pau do homem que oferecia trocar um produto falso pelo original como se fosse um favor.
— Claro. — E a vingança foi completa. Taka saiu com um relógio, colocou o celular para carregar e, eventualmente, aquele cara descobriria qual a consequência de roubar um nobre.
Saltando animado, o garoto andou por aí, acabou encontrando uma moça bonita e, como estava perdido, perguntou para ela sobre o caminho. Descobriu duas coisas, onde ficava o ônibus que ele tinha que pegar e que o bilhete que comprara era falso. Como ele esperava, aquele velho não valia a água que bebia.
A moça ainda mostrou para ele o caminho até o ponto de ônibus, mas teve que ir embora logo em seguida. Taka viu que o telefone já tinha carregado um pouco, por isso ligou para mãe enquanto esperava seu transporte.
— Cheguei, a viagem foi… — Começou empolgadíssimo, mas sua voz foi esmorecendo conforme recebia apenas “Uhum” como resposta. Sentindo a falta de interesse, apenas acabou com a ligação rápido.
“Por que achei que fosse ser diferente?”
O brilho do garoto diminui e seu celular foi colocado no bolso interno da jaqueta. Em seguida, o ônibus chegou, ele pegou, foi para o centro da cidade e, por ali, andou, andou, andou e se perdeu. Ele queria visitar já naquele dia a academia; mas, como esperado, ele não tinha ideia do caminho.
Pensou em perguntar para alguém na rua, principalmente quando viu uma moça linda passando, se sentiu tentado a usar isso como desculpa e começar uma conversa… acabou desistindo.
Escolheu usar um aplicativo de mapa no celular e descobriu que o caminho era fácil, seguir em linha reta para o sul da cidade. O tempo normal seria 20 minutos de caminhada, foi 30.
Ao chegar, não quis perder muito tempo na recepção. As aulas começariam no dia seguinte, mas já podia ir fazer o cadastro, por isso deu todos os seus dados e, quando estava acabando, foi chamada por uma garota linda e sorridente.
— Você é um dos novos alunos, né? — Chegou perto de forma amigável. — Sou estudante daqui a dois anos. Sou a líder dos alunos e parte da representação deles, por isso, se tiver algum problema, pode falar comigo ou com outro representante. Inclusive, estou indo treinar agora, mas posso te apresentar o lugar no caminho, o que acha?
O garoto a considerou deslumbrante, sua pele até lembrava um pouco porcelana de tão branca e delicada. Seus olhos e cabelos vermelhos eram lindos e a faziam se destacar em meio a multidões. Além disso, ela tinha um corpo atlético e bem proporcionado, com medidas um pouco acima da média.
A propósito, representante e líder dos alunos eram cargos completamente diferentes. O primeiro, se referia aqueles que ouviam e ajudavam os alunos, comunicando isso aos professores. Já o segundo, era a pessoa que, junto aos diretores e professores, decidia as regras da escola e garantia sua aplicação no dia a dia.
— Êh… — Voltando, Taka ainda estava deslumbrado com aquela beleza que quase o cegou, mas não queria parecer pervertido, por isso o depravado decidiu focar nos olhos dela. — O-olá… sim, seria muito legal se você me mostrasse o lugar.
Hina animadamente começou a guiá-lo, até podia estar cansada, mas não demonstraria isso, ou deixaria que isso afetasse seus planos para o dia. Encontrando forças de onde não tinha, a vampira teria mais um dia de trabalho frenético.
— Sou Hina, essa é Lola. — ela apontou para uma garota morena, na qual ele ainda nem tinha reparado — e você? — Ele respondeu se apresentando no instinto.
Fugindo de olhar para aquela linda vampira, Taka estranhou ver as longas orelhas de coelho da garota sem expressão que a seguia. Por sorte, lembrou que recentemente tinham mudado as regras da academia, por isso demi-humanos podiam estudar nela se provassem ter talento excepcional, por isso preferiu nem abrir a boca sobre.
No mínimo, forte aquela garota parecia, com seu corpo quase escultural de alguém que gostava de treinar. Sem contar que ela era sensual com sua leg colada que delimitava bem as curvas acentuadas. Taka também a chamaria de linda, tinha um belo rosto, lindos olhos vermelhos e um longo e ondulado cabelo branco, mas sua expressão fechada era um pouco intimidadora.
— Ok, Taka, vou começar com o básico. Já deve saber, amanhã começa o ano letivo, depois precisa olhar as matérias disponíveis em cada horário. Na academia, tudo depende da sua própria disciplina e esforço, até pode pedir para um professor te avaliar e recomendar certas aulas que deveria fazer; mas, no fim, quem monta a grade é você, é bom ser responsável. — Hina começou a explicar.
Depois ela ainda rapidamente mostrou algumas coisas. Falou do caminho para a diretoria; onde ficava a sala dos representantes dos alunos. Também explicou que haviam 5 deles responsáveis por ouvir e ajudar os estudantes. Por fim, apontou onde ficavam as principais salas e onde os alunos iam para malhar e treinar magias.
Mal entraram no lugar e se depararam com uma garota caindo no chão de exaustão. Era Saya, bonita e, para Taka, sua característica chamativa era ter um peitão. Na hora, ele andou na direção dela, queria oferecer alguma ajuda, mesmo que não pudesse fazer nada.
Muito mais rápida do que o garoto, Hina foi prestar socorro deixando Lola e Taka para trás, sendo deixado para trás, por ali ficou, não queria atrapalhar.
Logo a vampira fez uma massagem na perna da mulher caída, mandou alguém a levar para enfermaria e logo tem várias pessoas ao redor dela perguntando coisas.
— Êh… — Um silêncio desconfortável se formou, afinal Lola não parecia disposta a abrir a boca. — Ela parece estar bem atarefada. — Olhou para Hina.
— Sim.
Taka coçou a cabeça sem graça. — Espero não ter atrapalhado, não achei que ela fosse estar tão ocupada quando aceitei. Eu podia só ter perguntado para algum professor como as coisas funcionam por aqui.
— Não atrapalha.
— Tem certeza? Para mim parece que todo mundo quer falar com ela agora, talvez seja melhor só deixar para amanhã, então?
— Vai ser pior.
— Pior, como? Não consigo nem imaginar, deve ser tipo tortura ter que trabalhar tanto asism. Imagina, gente tem perguntado o que fazer o tempo todo… Apesar de que também parece um pouco legal, Hina é muito admirável. — Taka olhou com certa inveja.
— Sim. — Pela primeira vez, por mais sutil que fosse, Lola mostrou alguma reação emocional, seria difícil de notar, mas um micro-sorriso apareceu quando ouviu sua amada amiga ser elogiada.
Até aquele ponto, a garota aparentava estar com uma placa na testa dizendo: não fale comigo; contudo, quando o assunto era falar bem da vampira, parecia disposta a pelo menos ouvir.
— Realmente a admiro por, mesmo sendo tão ocupada, ter a gentileza de me ajudar. Provavelmente ela nem vai lembrar meu nome, mas sinto que, no dia que precisar, será alguém com quem posso contar.
— Humm! Que bom. — Não é porque estava mais disposta a ouvir sobre aquele assunto, que seria muito mais comunicativa. Taka apenas desistiu, era impossível ter um diálogo.
Pouco tempo depois Hina se livrou de todas as pessoas a sua volta e foi até Lola. — Já vou começar meu treino, pode ir preparando as coisas para mim. — Se virou para Taka. — Foi mal, estou sem tempo; mas, se quiser usar qualquer coisa por aqui ou ver os mapas do campus, é só abrir o aplicativo.
Taka deu um olhar de quem não tinha entendido nada, ele até tinha pesquisado antes de viajar, mas não tinha visto nada sobre, até porque era algo implementado a pouco tempo. — Aplicativo?
Hina olha o relógio. — Já estou quase sem tempo, por enquanto, pode contar com o Kel, é o emburrado de piercing sentado ali. Ele faz cara de mal, mas não morde, é só ir pedir ajuda, sei que vai conseguir se dar bem com todos.
Taka seguiu as instruções e acabou até conseguindo se enturmar mais ou menos. Foi ficando tarde e o garoto voltou para casa sem conseguir tirar aquela ruiva da cabeça. Porém ele nem ousava ter um crush nela, entendeu que se fosse seguir esse caminho a concorrência seria, provavelmente, 80% dos humanos no mundo, senão fosse mais.
“Seus olhos são tão vibrantes, aquele vermelho, não sabia que vampiros eram tão bonitos, mas… ela estava meio cansada, né?”
Além da beleza da vampira, o que não saia da cabeça do garoto era um pouco de preocupação. Hina rolaria de raiva e soubesse disso, todo o esforço para usar maquiagem e esconder seu cansaço para um garoto aleatório notar.
O jovem seguiu animado, tinha esperança de que, estando naquele lugar, poderia colocar seu nome na história. Bem, se estivesse mais atento, talvez tivesse notado uma sombra que o seguia sorrateiramente.